CHIII

CHIII
NADA
MAIS É
QUE UMA
SÍLABA

…Paradoxalmente e com um indicador em riste na frente da boca, CHIII é o som que quando prolongado por lábios humanos representa silêncio. No entanto, não se trata de uma onomatopeia que demanda ausência de ruído e sim um apelo para o aguçar dos sentidos e compenetração na audição dos arredores.

Sonido presente na chaleira que ferve água e na chuva que despenca do céu, CHIII também é o burburinho sagrado que emana de tudo aquilo que respira e tem o dom de fabricar vibração. Indo mais fundo, CHIII é uma releitura do pronome pessoal feminino do inglês. De um ponto de vista esotérico oriental, Yin é a energia feminina que aglutina aquilo que é obscuro, o inconsciente e o que está abaixo do compreensível.

“氣”

Já o ideograma acima é a representação do chinês para CHI, que na cultura oriental tradicional seria a força cósmica vital que conecta o universo, o que muitos chamam apenas de amor. Outro modo de escrever ao se referir a esse fluxo de energia seria Qi. O ideograma também é aplicado ao se referir ao ar, respiração e vapor.

É maravilhoso notar como poucas letras ou apenas um símbolo contém filosofia, múltiplos significados e ancestralidade que dialogam com nosso presente. Perceber música como matemática sonorizada sem dimensões engessadas e que alimenta o espírito é vital para o CHIII – Festival de Música Criativa.

O sopro da criação transcende a parábola bíblica. É um conceito arcano que habita todo ser. É a habilidade de sermos antenas para absorver o caos da criação e, com a simbiose do indivíduo mais um instrumento, modelá-lo no que resulta ser nossa interação com o indizível e o insondável. Talvez música tenha nascido assim: puro flerte com o abismo e a necessidade de conversa com o Mistério sem um idioma pré-determinado e apenas sentido.

Apesar de os milênios e os séculos terem firmado fórmulas para direcionar composições musicais, talvez o ato mais musical ainda seja o de se deparar com um objeto ou ferramenta e arrancar expressão dele sem obrigatoriamente espremer um som guiado por partituras ou buscando uma melodia tradicional.

Se deixar guiar pela intuição ou buscar uma subversão de linguagens consagradas estabelece a mais essencial das técnicas musicais: explorar, investigar, virar do avesso, explodir e colar de outra maneira. Enfim, CHIII é perseguir a expansão de uma fronteira infinita que não cabe em nenhuma rádio ou gênero massificado.​

Caio Luiz
jornalista e produtor de conteúdo